segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Velhice, solidão e parvoice por não sabermos valorizar o que de melhor temos.

Num shopping, numa movimentada praça da restauração, pouso o tabuleiro com o nosso lanche e sento-me.

Tal como o habitual (mea culpa para mim) abstraio-me da conversa e perco-me a observar as pessoas que me rodeiam. À minha direita um jovem casal de adolescentes apaixonados; à minha esquerda dois homens, duas crianças e uma senhora. Uma loira, envergando um justo jumpsuit, unhas de gel, altiva do cimo dos seus saltos altos, aproxima-se da mesa deles, despejando um tabuleiro recheado de artigos do Mac’Donalds! Volta-se para as crianças e sai-se com esta preciosidade: “comam, calem-se e não me chateiem”.

Constrangida, olho em frente e deparo-me com uma senhora. Casaco preto, cabelo grisalho e apanhado num puxo, sentada com um saco do hipermercado ao lado. De olhar carinhoso mas triste vai olhando em volta, procurando que um qualquer par de olhos de todos aqueles que por ali passam apressados, repare em si.

Volto à nossa conversa, ao meu lanche mas rapidamente volto a observar a senhora. Tenho dificuldade em desviar o meu olhar e esperança de que o seu olhar encontre o meu para que lhe possa sorrir e fazê-la sentir que não está só. Tendo em conta a aparência dos seus joelhos e calcanhares, o facto de usar num pé um sapato e no outro uma pantufa, penso que terá dificuldades de mobilidade. Questiono-me como terá chegado ali. Terá vindo sozinha? Terá sido trazida por alguém que ali a deixou enquanto foi fazer compras ou apreciar uma sessão de cinema? Interrogo-me sobre que sociedade é esta, que jovens somos nós que não sabemos valorizar os nossos “velhinhos”, as nossas riquezas, as nossas tradições e heranças culturais e humanas.

Continuo a observá-la e parece-me que se quer levantar mas não consegue. Foi uma tentativa tímida de fazê-lo, mas frustrada. Passado pouco tempo uma nova tentativa, penso eu, e novamente falhada. Terminamos de lanchar e eu não consigo ficar alheada e passiva face à situação. Dirijo-me à senhora e pergunto se quer ajuda para levantar-se. Estranhando, parece não perceber a minha abordagem e o que lhe pergunto, parecendo até temer a minha atitude. Volto a questioná-la e, abanando a cabeça, diz-me que não. Fico um pouco embaraçada com a sua reacção e pela minha intromissão e retiro-me pedindo desculpa.

À noite, deitada na cama, não consigo esquecer aquele olhar perscrutador, carente de afecto.

Recordo-me da letra da Mafalda Veiga, sobre o velho do banco do jardim…

“o olhar triste e cansado procurando alguém
e a gente passa ao seu lado a olhá-lo com desdém
sabes eu acho que todos fogem de ti pra não ver
a imagem da solidão que irão viver
quando forem como tu
um velho sentado num jardim”

E esta letra, que em tempos também me ajudou a safar no exame de gerontologia, volta a exercer em mim um efeito devastador! E são estas palavras, que não são minhas, que de uma óptima forma descrevem aquilo que observei.

Sem comentários: